terça-feira, 25 de maio de 2021

Vereadores ameaçam o Centro Histórico de Belém com nova tentativa de alteração na legislação urbanística

    



    Depois da construção irregular de um empreendimento do Atacadão no coração do Portal da Amazônia, embargado pelo Ministério Público Estadual por 02 anos, e depois liberado pelo MPE por  um TAC (Termo de Ajuste de Conduta) espúrio, dando à Prefeitura o respaldo "legal" para liberar as licenças de instalação, a orla do Centro Histórico de Belém mais uma vez está sendo negociada na Câmara de Belém. 

  O vereador Mauro Freitas, com total apoio do Presidente da Câmara Municipal Vereador Zecão Pirão, conseguiu fazer acordo com líderes de bancadas para colocar em votação a derrubada do veto do Prefeito Zenaldo Coutinho ao Projeto de Lei nº 01 de 21 de outubro de 2020, de autoria do vereador Nehemias Valentin (PSDB), com emenda do ver. Mauro Freitas. O projeto vetado visa a alteração do inciso V do § 1º do Art. 98 da Lei Complementar nº 02 de 19 de julho de 1999 (LCCU/1999), que dispõe sobre o parcelamento, uso e ocupação do solo do município de Belém, e o Anexo X da Lei nº 8.655 de 30 de julho de 2008, que dispõe sobre o Plano Diretor de Belém, correspondente ao Quadro de aplicação de modelos urbanísticos - Anexo 3 da LCCU/1999. 

    Essa alteração permitirá que a nossa orla do Rio Guamá (Orla Setor A que vai da Av. Bernardo Sayão à Av. Tamandaré) seja ocupada por empreendimentos de comércio varejista/atacadista e depósitos de grande porte, numa área que deveria ser requalificada e reurbanizada, dando continuidade ao Portal da Amazônia, para usufruto de toda a população. 

    Os vereadores de Belém insistem em atropelar o devido rito legal, pois consoante norma inserta no artigo 40 , § 4º , da Lei 10.257 /2001 (Estatuto das Cidades) o processo de revisão ou alteração do Plano Diretor da Cidade tem que ser precedido de uma fase pré-parlamentar que possibilite o debate e participação popular e comunitária e realização de estudo técnico, o que foi sobejamente justificado pelo ex-prefeito Zenaldo Coutinho em seu veto, lembrando ainda que o município está em processo de revisão do seu Plano Diretor. 

    A 3ªPromotoria de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural, por meio do Promotor Público Raimundo Moraes, já enviou Recomendação à Câmara de Vereadores, alertando para a ilegalidade do processo de alteração da legislação urbanistica, sem estudos técnicos e sem participação da sociedade. 

    Abaixo reproduzimos a Carta de entidades da sociedade civil organizada, em repúdio às negociatas, travestidas de boas intenções, mas que escondem interesses poderosos do mercado imobiliário e empresarial. As entidades e cidadãos que quiserem assinar, acesse o link: https://forms.gle/cEXFB175wW4vjwqE7


CARTA MANIFESTO DE TÉCNICOS, ARQUITETOS E URBANISTAS E ENTES REPRESENTATIVOS DA SOCIEDADE CIVIL CONTRA A DERRUBADA DO VETO DO PL Nº01 DE 21 DE OUTUBRO DE 2020

Na última quinta-feira (13/05/2021), foi deliberada no Colégio de Líderes da Câmara Municipal de Belém (CMB), posição favorável ao retorno do veto do ex-prefeito Zenaldo Coutinho ao Projeto de Lei nº 01 de 21 de outubro de 2020, de autoria do vereador Nehemias Valentin (PSDB), à votação em plenário da CMB.

O projeto visa a ALTERAÇÃO DO INCISO V DO § 1º DO ART. 98 DA LEI COMPLEMENTAR Nº 02 DE 19 DE JULHO DE 1999 (LCCU/1999), QUE DISPÕE SOBRE O PARCELAMENTO, USO E OCUPAÇÃO DO SOLO DO MUNICÍPIO DE BELÉM, E O ANEXO X DA LEI Nº 8.655 DE 30 DE JULHO DE 2008, QUE DISPÕE SOBRE O PLANO DIRETOR DO MUNICÍPIO DE BELÉM, CORRESPONDENTE AO QUADRO DE APLICAÇÃO DE MODELOS URBANÍSTICOS – ANEXO 3 DA LCCU/1999.

No intento de incluir na legislação urbanística vigente parâmetros de uso e ocupação do solo permissivos à construção de empreendimentos de comércio varejista/atacadista e depósitos na região da Orla Setor A da ZAU 5 do zoneamento municipal, zona destinada à recuperação urbanística e paisagística (Av. Bernardo Sayão a Rua do Arsenal com Av. Tamandaré), os ilustres vereadores trazem à mesa diretora desta Casa Legislativa um projeto de lei de caráter ilegal e irregular, já tendo este sido vetado inclusive pela gestão anterior, em 30 de novembro de 2020, com base em parecer técnico fornecido pela Secretaria Municipal de Urbanismo – SEURB, manifestando expressamente sua posição contrária à alteração.

IRREGULAR, pois as alterações propostas não obedecem às diretrizes estabelecidas no Plano Diretor (PD) do Município de Belém (Lei Nº 8.655/2008) que norteiam os usos e atividades a serem realizadas em cada zona estabelecida pelo PD, com potencial de transformação urbana. No caso específico da área de Orla Setor A da ZAU 5, a Orla do Rio Guamá se apresenta com diretrizes e objetivos claros voltados à recuperação da paisagem e requalificação de áreas de urbanização precária, bem como controle do adensamento construtivo e promoção de mecanismo de regularização fundiária, com prioridade para intervenções que visem a melhoria do saneamento básico, condições de moradia, acessibilidade e mobilidade, ou seja, melhoria da qualidade de vida da população residente na área que engloba alguns dos mais populosos bairros de Belém.

Nenhuma das diretrizes estabelecidas para o desenvolvimento urbano dessa zona da nossa cidade compete à instalação de empreendimentos do tipo comércio varejista/atacadista e depósitos, cujas consequências da instalação envolvem alterações permanentes na qualidade e ambiência paisagística, assim como alterações necessárias para o trânsito de cargas e mercadorias que impactam diretamente na vida da população residente e na manutenção da qualidade ambiental do setor de orla.

ILEGAL, uma vez que a própria legislação municipal (Lei Nº 8.655/2008) veta qualquer alteração nos instrumentos de ordenamento territorial sem que essa passe pela análise e parecer do Conselho de Desenvolvimento Urbano (CDU), cujas atividades encontram-se suspensas por decisão do juiz de Direito da 5ª Vara da Fazenda e Tutelas Coletivas do Ministério Público do Pará, Raimundo Rodrigues Santana, desde 10 de dezembro de 2020. Para além disso, o Estatuto da Cidade, Lei Federal N° 10.257 de 10 de julho 2001, instância máxima da gestão territorial e urbana no Brasil, que regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal e estabelece diretrizes gerais da política urbana brasileira, garante à obrigatoriedade da gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano, vetando qualquer alteração nesses instrumentos de regulação sem que haja discussão entre o Poder Público Municipal e a sociedade civil, através da realização de audiências públicas, de acordo com o inciso XIII do Art. 01º e inciso I do § 4º do art. 39 da Lei Federal Nº 10.257/2001.

Ainda que tenha sido erroneamente sancionada legislação municipal que desobrigue a realização de audiências públicas para a efetivação de qualquer alteração nos instrumentos de planejamento urbano, de acordo com a Constituição Federal brasileira, nenhuma lei ou decreto municipal pode se opor à legislação federal, sendo assim, qualquer regulamentação municipal que se oponha ao estabelecido na Lei Federal N° 10.257 de 10 de julho 2001 será passível de judicialização.

É válido ressaltar que recentemente, no ano de 2020, ocorreu a implantação irregular, tendo sido inclusive embargado, empreendimento do tipo comércio atacadista na região que hoje se busca a alteração definitiva dos parâmetros de ocupação. O precedente aberto para a implantação de outros empreendimentos do mesmo tipo não traz qualquer perspectiva positiva à população e ao desenvolvimento urbano sustentável da cidade de Belém. Além de impactar diretamente na área correspondente ao Centro Histórico de Belém e seu entorno, tombado e protegido pela Lei Municipal Nº 7. 709, de 18 de maio de 1994, comprometendo a orla do Beco do Carmo (Rua São Boaventura) ao lado de um dos mais importantes bens culturais da cidade, a igreja e Capela da Ordem Terceira e de Nossa Senhora do Carmo tombadas também a nível federal. Ainda mais grave, o empreendimento se apossou de parte dos lotes dos moradores da Vila Rio, no bairro da Cidade Velha, que lutam até hoje  na justiça pelos seus direitos, ao que parece, também ignorados.

  Nesse sentido, os técnicos, arquitetos e urbanistas e entes representativos da sociedade civil, signatários desta carta manifesto, se posicionam firmemente contra a derrubada do veto ao projeto de lei e contra qualquer alteração em nossa legislação urbanística que intente passar por cima do caráter soberano da participação popular nos processos de decisão dos rumos da nossa cidade, sobretudo quando os impactos dessa legislação se dão sobre áreas de periferia, onde os trabalhadores são os maiores prejudicados por processos que legitimam sua exclusão dos espaços que interessam à elite.

É urgente que se entenda, de uma vez por todas, o papel central da gestão democrática da cidade para se alcançar o desenvolvimento urbano tão almejado para nossa querida Belém, compreendendo que o desenvolvimento urbano é sinônimo de promoção de promoção de qualidade de vida, saúde, bem-estar, segurança de posse e dignidade, para a nossa população, bem como o convívio harmônico com a paisagem natural de Belém, tão valiosa à perpetuação da nossa identidade cultural e social enquanto povo amazônico, na qual não cabe ceder aos interesse do capital que nos impõe um ideal de cidade que serve somente aos interesses de poucos.

Para nós, romper os silêncios na cidade de Belém é também garantir a participação popular nos processos que interferem diretamente na produção do espaço urbano, em nossas vidas e na forma como vivenciamos a cidade. Em defesa da primazia da gestão democrática e popular do Município de Belém, garantido a todas e todos os habitantes pela instância máxima do Estatuto da Cidade, dizemos NÃO ao Projeto de Lei nº 01 de 21 de outubro de 2020, e somamos forças para manutenção do veto à flagrante tentativa golpista de alterar dois dos nossos principais instrumentos de ordenamento territorial sem ampla escuta da população, principal interessada nos rumos a serem decididos para a Belém da Nossa Gente, em um momento crucial da nossa história.

 

Assinam este documento,

Ver. Bia Caminha (PT)

Rede Para Romper Silêncios

Associação dos Amigos do Patrimônio de Belém - AAPBEL

União Nacional Por Moradia Popular do Pará - UNMP/PA
Laboratório Cidades na Amazônia - LABCAM/UFPA
Laboratório da Cidade

Fórum de Entidades de Defesa do Patrimônio Cultural Brasileiro – Pará

 



2 comentários:

  1. Chega de abusos! Vamos manter o veto, e impedir mais agressões que tendem a descaracterizar a paisagem urbana e natural de nossa Belém, para atender os interesses espúrios da elite.

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  2. Já chega de agressão no nosso estado e cidade!

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