quinta-feira, 15 de fevereiro de 2018

Revisão do Plano Diretor 2018: Belém clama por participação popular!

Belém da Desiguadade

O Crescimento desordenado de Belém é fruto de decisões politicas daqueles que sempre mandaram na cidade, as elites a moldam para atender as suas necessidades, pouco se importando com as demandas das camadas mais empobrecidas por mobilidade, saneamento, saúde, educação. A Constituição de 1988 trouxe a possibilidade desse cenário mudar com o inédito capitulo da política urbana (artigos 182 e 183) estabelecendo que o objetivo da politica urbana é “o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes”. A politica urbana é executada pelos municípios, segundo diretrizes gerais fixadas em Lei Federal (Lei nº 10.257/01 – Estatuto da Cidade), nesse contexto o Plano Diretor possui um papel fundamental, pois é o principal instrumento de planejamento do desenvolvimento urbano e disciplina o exercício do direito de propriedade urbana.
Belém da Imobilidade
Belém do crescimento desordenado

O Plano Diretor, definido nas diretrizes do Estatuto da Cidade, trata-se tanto de um instrumento de intervenção do poder publico para promover as funções sociais da cidade (direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte, aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer” – Art. 2, I do Estatuto da Cidade) como também é um instrumento que estabelece limites sobre o exercício do direito de propriedade urbana, por meio das limitações urbanísticas (zoneamento, índices e coeficientes urbanísticos, licenciamento urbanístico). Em consonância com esse entendimento, acreditamos que atualmente a principal função do Plano Diretor é indicar qual é o projeto de cidade que a cidade quer, ou seja, é o documento legal onde a cidade fixa o seu projeto de “FelizCidade”.
Belém e seu patrimônio histórico
Diante dessa compreensão, na perspectiva do Estatuto da Cidade, projetar a cidade não deve ser uma prerrogativa de uma parcela de “iluminados” guiados por uma suposta razão técnica, que se auto intitula superior à leitura da comunidade sobre a cidade, uma lógica positivista que supostamente se arvora a dizer o que é melhor para a cidade. Dessa forma, o Plano Diretor, sua elaboração e respectiva revisão, devem seguir os marcos do Estado Democrático de Direito, em linhas gerais, a legalidade do Plano Diretor, possui como condição de validade, a legitimidade popular. Então, o processo de elaboração/revisão do Plano Diretor, possui seus princípios e regras estabelecidos no Estatuto da Cidade.
Vejamos, o que diz a Lei nº 10.257/01 – Estatuto da Cidade:

Art. 40. O plano diretor, aprovado por lei municipal, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana.
§ 1o O plano diretor é parte integrante do processo de planejamento municipal, devendo o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias e o orçamento anual incorporar as diretrizes e as prioridades nele contidas.
§ 2o O plano diretor deverá englobar o território do Município como um todo.
§ 3o A lei que instituir o plano diretor deverá ser revista, pelo menos, a cada dez anos.
§ 4o No processo de elaboração do plano diretor e na fiscalização de sua implementação, os Poderes Legislativo e Executivo municipais garantirão:
I – a promoção de audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade;
II – a publicidade quanto aos documentos e informações produzidos;
III – o acesso de qualquer interessado aos documentos e informações produzidos.

Com esse texto queremos destacar, nesse momento, o processo de revisão do Plano Diretor e a obrigatória garantia da participação popular em todas as suas etapas, se deve não só pelo fato de que o poder público incorre em improbidade administrativa se não garantir a participação, mas sobretudo pelo caráter democrático e a imperiosa necessidade de fazer da participação o centro da reconstrução de Belém e seu projeto de “FelizCidade”. Deixando claro que o processo de revisão do Plano Diretor não é um espaço somente para o Prefeito e sua equipe técnica, vereadores e mercado imobiliário decidirem sobre os destinos da cidade.
O Processo de revisão do Plano Diretor, segundo normas federais, deve garantir que todos os segmentos da cidade, indistintamente, participem e opinem sobre a cidade. Nesse sentido, duas questões, preliminares devem ser consideradas. A primeira é a composição do Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano (Lei nº 9.313 de 31 de julho de 2017) que possui dentre outras funções: “analisar, debater, deliberar e participar dos processos de elaboração e revisão do Plano Diretor do Município de Belém, da lei de uso e ocupação do solo e outras regulações urbanísticas;”. O artigo 2º da Lei municipal nº 9.313/2017 dispõe sobre a composição do Conselho de Desenvolvimento Urbano:

Art. 2º O CDU será integrado por 18 (dezoito) membros titulares e seus respectivos suplentes, nomeados pelo chefe do Poder Executivo Municipal, tendo a seguinte composição:
I - 9 (nove) Conselheiros representantes do Poder Público Municipal, assim discriminados:
a) 8 (oito) membros natos, composto pelo Prefeito de Belém, que presidirá o Conselho, e pelos gestores da Secretaria Municipal de Coordenação Geral do Planejamento e Gestão (SEGEP), Secretaria Municipal de Urbanismo (SEURB), da Secretaria Municipal de Saneamento (SESAN), da Secretaria Municipal de Habitação (SEHAB), da Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana de Belém (SEMOB), da Secretaria Municipal de Economia (SECON) e da Companhia de Desenvolvimento e Administração da Área Metropolitana de Belém (CODEM).
b) 1 (um) membro indicado pela Câmara Municipal de Belém.
II - 9 (nove) Conselheiros representantes da Sociedade Civil, relacionadas ao planejamento e desenvolvimento urbano:
a) 2 (dois) membros das organizações que congregam as entidades representativas da classe trabalhadora;
b) 2 (dois) membros das organizações que congregam as entidades representativas de movimentos sociais e populares;
c) 2 (dois) membros das organizações que congregam as entidades representativas da classe empresarial;
d) 3 (três) membros das organizações que congregam as entidades científicas, tecnológicas e os conselhos de classe.

E a principal questão que trazemos para o debate, é que será da competência do Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano, a deliberação sobre a metodologia participativa da revisão do Plano Diretor e como dissemos acima, acreditamos que tal metodologia participativa não deve ser definida por uma meia dúzia de técnicos e burocratas. O Conselho ainda não foi nomeado pelo Sr. Prefeito Municipal, acreditamos que a forma adequada para a formação do Conselho e que respeite a legitimidade democrática é que o poder público municipal convoque um congresso da cidade para deliberar sobre as questões centrais que deverão nortear o processo de revisão do Plano Diretor, por exemplo: a incorporação dos objetivos do desenvolvimento sustentável traçados pelas nações unidas; conhecida como Agenda 2030, a incorporação da Nova Agenda Urbana (Habitat III); debate sobre os projetos de cidade atualmente em disputa (Cidade da Gastronomia ou Cidade Cidadã ?); debate sobre como tornar a cidade mais segura para as mulheres; inclusiva para idosos, crianças e deficientes físicos, como pensar Belém sob a perspectiva metropolitana dentre outros temas.
Então, o processo de Revisão do Plano Diretor é muito mais do que promover uma adequação legislativa. A experiência histórica nos mostrou que desde o Plano Diretor de 1993, passando pelo Plano Diretor de 2008, pouco ou quase nada foi feito par efetivar os seus instrumentos de intervenção do poder publico que não sejam para beneficiar o mercado imobiliário, penso que a hora é de pensarmos em uma nova agenda para o desenvolvimento da cidade.

Em síntese, acreditamos que a revisão do plano diretor de Belém não é só um imperativo legal ou uma formalidade a ser cumprida pelos gestores públicos, ou ainda não é só um momento para promover adequações legislativas, acreditamos que o processo de revisão do plano diretor deve ser precedido da realização de um Congresso da Cidade, onde tenhamos a oportunidade de debater as questões centrais para o desenvolvimento de Belém, bem como fazer o debate sobre as entidades que deverão compor o Conselho de Desenvolvimento Urbano.

Belém, 14 de fevereiro de 2018.

Maurício Leal Dias
Professor da Faculdade de Direito – UFPA

Mayara Rolim
Núcleo de Altos Estudos Amazônicos – NAEA/UFPA

Nádia Brasil
AAPBEL – Associação dos Amigos do Patrimônio de Belém   


Belém clama por participação popular