segunda-feira, 24 de julho de 2017

Convento dos Mercedários em disputa: entre a privatização e o uso público


Diante da sanha privatizante dos atuais governos municipal e estadual, a sociedade tem acompanhado com preocupação o destino de um dos mais significativos monumentos que compõe o acervo arquitetônico de Belém, por ser o mais bem preservado convento colonial na amazônia portuguesa. Desde que alguns órgãos federais deixaram suas dependências, o secular Convento dos Mercedários está sem uso e vem despertando o interesse de alguns agentes sociais. 
Primeiramente se noticiou que o governo do estado estaria intermediando a cessão do mesmo junto à Superintendência do Patrimônio da União - SPU/PA, para que ali fossem instalados o curso de gastronomia e um museu da gastronomia, da Universidade Estácio-FAP. 
Nota na coluna do jornalista Mauro Bonna, Diário do Pará, abril de 2015.
Mais recentemente tem se noticiado que a Prefeitura de Belém estaria à frente das negociações junto à SPU/PA para que o prédio fosse repassado ao Grupo hoteleiro Galé, de Portugal. 



Nota na coluna Repórter 70, do Jornal Liberal, do dia 21.06.17 


Nota da Coluna Repórter 70, do Jornal Liberal, do dia 23.07.17

Por se tratar de um bem público e de inestimável valor histórico, questionamos a legitimidade e legalidade da operação, que tornaria o bem de uso privado. Apesar de compreendermos que é justo a preocupação com a destinação e manutenção dos imóveis da União, isso não justifica sua privatização, ainda mais em se tratando de um bem tombado, que exige projetos compatíveis e em harmonia com a história e a memória da cidade. 
O intento dos governos municipal e estadual fica ainda mais descabido, quando sabemos que desde de 2015 à UFPA vem manifestando interesse pelo prédio junto à SPU, inicialmente a ideia era compartilhar as dependências com o IPHAN, mas com a desistência desse último, a UFPA apresentou novo projeto, onde solicita a cessão do prédio para instalar o Núcleo Avançado de Conservação e Restauração da Amazônia, o qual além de abrigar o Curso de Graduação em Restauro de Bens Culturais, alia centro de cultura, museu, ensino, pesquisa e extensão.
Preocupada com o abandono do bem e por outro lado qual o destino que será dado ao mesmo, a AAPBEL protocolou representação no Ministério Público Federal, solicitando a intervenção da Procuradoria Federal para investigar o processo de cessão do prédio junto à SPU, considerando que entre as diretrizes definidas para imóveis da União se deve em primeiro lugar observar-se o interesse público quanto à destinação dos bens, nada justificando repassar o bem para terceiros, sendo que um ente da própria União tem interesse no mesmo, pautado em um projeto amplo, de cunho social, cultural, educacional, científico e de valorização ao turismo e economia locais.  
A sociedade espera que disputas incensadas por interesses nada republicanos e coletivos venham acabar por impedir a implantação do projeto da UFPA, que permite ampla visitação à sociedade e usufruto público, com atividades educativas, científicas, áreas expositivas, livraria, biblioteca, espaços culturais e afins, permitindo melhor dinâmica de uso, com impacto positivo no meio ambiente urbano e paisagístico, atuando como motivador para a reabilitação do entorno imediato, com potencial para inserção de outras atividades compatíveis nas redondezas.    

Um pouco da História do Complexo dos Mercedários


As origens do Convento dos Mercedários remonta ao ano de 1640, com a chegada dos padres mercedários ao Pará e a construção de uma pequena igreja em taipa. A atual construção foi concluída em 1777. Projetado pelo arquiteto italiano Antônio José Landi, é uma das poucas igrejas brasileiras com fachada convexa e frontão de linhas onduladas. Em 1794, os mercedários são expulsos da província, sendo instalada nas dependências do Convento a sede da Alfândega. Foi intensamente utilizado durante a revolta da Cabanagem em 1835, tendo ali funcionado posteriormente, o Trem de Guerra e o Quartel de Milícia, além do Arsenal de Guerra, a Recebedoria Provincial, os Correios, o Corpo de Artilharia e o Batalhão de Caçadores. No século XIX ficou a igreja abandonada e fechada ao culto por muitos anos, servindo de depósito e tendo muitas de suas obras estragadas e roubadas. Deve-se à D. Santino, quando assumiu a arquidiocese, as obras de restauração que permitiu a reabertura da igreja em 1913 . Em 1978, um incêndio destruiu quase todo o convento, sendo a igreja pouco afetada. Em 1986 o conjunto foi integralmente restaurado pelo IPHAN.

segunda-feira, 10 de julho de 2017

Governo abandona prédio histórico


Telhados tomados por buracos e plantas, paredes infiltradas, piso encharcado pela água empoçada e documentos históricos sendo destruídos pela ação do tempo. Esse é o quadro atual do prédio onde funcionou o Instituto Estadual de Educação do Pará (IEEP), edificação centenária encravadano centro de Belém e que hoje pena com o abandono. O Ministério Público Federal (MPF) instaurou inquérito civil público a partir de denúncias da Associação dos Amigos do Patrimônio de Belém (AAPBEL) para apurar a situação do edifício, que deixou de funcionar como escola em 1996 e hoje está sem manutenção e com o telhado comprometido. E a situação piorou nos últimos anos.

No segundo andar, há 10 salas de aula e, embaixo, funcionava o setor administrativo, arquivo e o salão nobre. “O grande problema é que o prédio está sem qualquer uso. Por essa razão, vem se deteriorando com o tempo, há pelo menos 5 anos” revela a professora Aurilea Abelem, vice-presidente da AAPBEL. O telhado está tomado por goteiras e a água que cai já prejudica o piso de tábua corrida. As paredes estão cheias de infiltração e o sistema elétrico já está todo comprometido, com risco iminente de curto-circuito. As calhas caíram e a maioria das janelas foi quebrada. O abandono é tamanho que plantas (trepadeiras) já crescem no telhado do prédio, tanto pelo lado de dentro como de fora.
Do lado de fora, dá para ter uma ideia do abandono. Janelas estão quebradas. (Foto: divulgação)
ACERVO

De instituição de ensino do século passado respeitada, o IEEP se transformou num grande arquivo bibliográfico, que está se perdendo. “É um acervo riquíssimo prejudicado pela ação do mofo e dos cupins”. No antigo prédio também funciona uma biblioteca. Aurileia defende que o prédio seja reformado e transformado num espaço de memória, centro de formação de professores ou até um Museu da Educação.
Arcevo de livros históricos está se perdendo com a ação do mofo e cupins. (Foto: divulgação)
O prédio continua sendo administrado pela Secretaria de Estado de Educação do Pará (Seduc). O procurador regional da República José Augusto Torres Potiguar enviou ofício ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), solicitando informações sobre o tombamento do prédio e requisitando agendamento de vistoria no local.

IPHAN CONTRADIZ SEDUC SOBRE REFORMA

Em nota, a Seduc informou que, em 2014, reformou as salas de aula, bloco administrativo e no ginásio de esporte do estabelecimento. De acordo com a secretaria, o prédio do IEEP é tombado como patrimônio histórico e a Seduc não teve permissão do Instituto do Patrimônio Histórico Nacional (Iphan) para fazer, a reforma na parte tombada do prédio, há 3 anos. De acordo com a legislação que rege bens tombados, prossegue a secretaria, qualquer intervenção só pode ser feita pelo Iphan. “Por causa dessa norma, a Seduc teve permissão para reformar apenas o telhado e o complexo de banheiros do edifício localizado na esquina da avenida Serzedelo Corrêa e rua Gama Abreu, no bairro da Campina”.

Por outro lado, Carmen Lustosa da Costa, especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental do Iphan, esclarece que o imóvel é tombado pelo Estado, não pelo Iphan. “Para o Iphan, o imóvel é considerado de interesse à preservação, mas por estar localizado na área de entorno, as diretrizes para intervenção não são tão rigorosas como se estivesse em área tombada ou mesmo tombado individualmente”, esclarece. O prédio do IEEP está localizado no entorno do Theatro da Paz e Conjunto Arquitetônico, Urbanístico, Paisagístico dos bairros da Cidade Velha e Campina, bens tombados pela União. Ela garante que não há registro no Iphan de solicitação da Seduc para reforma do prédio e que o IEEP não foi notificado pelo Ministério Público sobre essa questão.
Telhados e paredes possuem muitas infiltrações, prejudicando a estrutura do prédio. (Foto: divulgação)
IEEP

O edifício do Instituto Estadual de Educação do Pará (IEEP), de estilo neoclássico, é uma obra do arquiteto italiano Felinto Santoro, em estilo eclético, e foi inaugurada em 1904 para sediar o jornal A Província do Pará. Em 1926, foi comprada pelo Governo do Estado para abrigar a Escola Normal. Ao longo do século XX, o prédio do IEEP se tornou um símbolo da Educação paraense. Ele deixou de funcionar como escola em 1996, com a extinção dos cursos de magistério a nível médio.

(Luiz Flávio/Diário do Pará)