terça-feira, 18 de abril de 2017

Ver o Peso: Prefeitura tem novo prazo e feirantes reclamam do abandono

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Sociedade civil organizada busca informações sobre licenciamento da reforma
A Prefeitura de Belém tem até meados de maio para se manifestar sobre as alterações no projeto de reforma da Feira do Ver-o-Peso exigidas pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
Apresentado originalmente entre fevereiro e março do ano passado, o projeto foi avaliado e devolvido pelo Iphan em dezembro, com recomendações de ajustes para evitar impactos negativos sobre a ambiência do conjunto tombado e garantir maior participação da sociedade e dos trabalhadores da feira no processo de planejamento, entre outras ressalvas.
Em fevereiro deste ano, dois meses após o parecer do Iphan ser divulgado, o Ministério Público Federal (MPF) cobrou um posicionamento do Município.
No fim de março, a prefeitura pediu mais um prazo para responder. E foi concedido. Serão mais 30 dias úteis para manifestação oficial, contando a partir do recebimento do ofício pela administração municipal.
As informações foram repassadas pelo procurador da República José Augusto Potiguar, em reunião com feirantes e representantes da sociedade civil realizada no dia 5 de abril, na sede do MPF. A reunião foi marcada após declarações do presidente da Câmara Municipal de Belém, vereador Mauro Freitas (PSDC), em plenário, que criticavam a não realização da obra em 2017.
Setores se mobilizam contra declarações de vereador
A maior preocupação dos participantes do encontro é que as pressões políticas manifestadas pelo vereador, que é líder do governo na casa legislativa, fragilizem o Iphan, na medida em que a antiga superintendente do órgão licenciador no Pará, Maria Dorotéa de Lima, tem sido acusada de impedir a realização do projeto.
Os recursos acabaram se perdendo e a responsabilidade por isso é da ex-presidente do Instituto, Dorotéa de Lima, e também do ex-vereador e deputado estadual [Carlos] Bordalo, que inclusive fez campanha e liderou manifestações contra a obra”, afirmou o vereador Mauro Freitas em matéria veiculada pela Câmara Municipal de Belém no dia 30 de março.
Técnica de carreira do Iphan com experiência reconhecida local e nacionalmente, Lima atendeu às reivindicações dos feirantes, associações de trabalhadores da feira e de diversos movimentos sociais para a abertura de uma consulta pública que permitisse a incorporação de mudanças ao projeto.
Nós queremos sim a reforma do Ver-o-Peso, precisamos de uma, mas não nesse sentido [que está sendo proposto]. Nós fomos vitoriosos, conseguimos adiar, mas a luta ainda não terminou”, desabafou o feirante Manoel Rendeiro, o Didi, do setor de hortifrutigranjeiros, uma das lideranças do movimento de trabalhadores da feira que contestaram o projeto de reforma.
Em seguida, Didi desmentiu as declarações do vereador: “Eu vejo a Câmara Municipal que nunca nos chamou para debater e agora está sendo mobilizada para tentar desestabilizar a gente. Eles estão muito mal informados, não sabem nada. Quem liderou o movimento fomos nós feirantes. Não foi deputado, não foi superintendente. Fomos nós, nós é quem fomos para cima. Somos nós que queremos que sejam feitas essas adequações”.

Silêncio e abandono preocupam movimentos

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Trabalhadores da feira denunciam abandono do local pela prefeitura
Depois dos debates que se seguiram à apresentação do projeto de reforma [original], a prefeitura praticamente largou o Ver-o-Peso. O que a gente sabe e sabia até agora é através dos jornais e algumas informações que uma pessoa ou outra que se preocupa com o Ver-o-Peso nos dá, porque a prefeitura mesmo não fala nada. E a gente deduz que esse abandono, esse descaso é intencional. Exatamente para poder nos pegar de surpresa”, critica o feirante Dalcir Cardoso, do setor de industrializados, durante uma conversa na feira dias antes da reunião no Ministério Público Federal.
Para mim, estão substituindo a [ex-superintendente do Iphan no Pará] Dorotéa porque a Dorotéa era a única pessoa num órgão público bem preparado para enfrentar a prefeitura, para enfrentar os desmandos, apontar as falhas e exigir que as coisas sejam feitas corretamente. Com a coragem que a Dorotéa tinha, através do Iphan, eles recuaram, se fecharam em copas, ficaram quietos sem dar resposta de nada. E eu suspeitei desse silêncio”, completa.
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Feirantes reclamam da falta de manutenção e assistência na feira pela prefeitura
Segundo o procurador Potiguar, do MPF, não há possibilidade de a prefeitura impor a reforma sem autorização do Iphan. “Vamos dizer, num raciocínio de advogado do diabo, que a Prefeitura chegue a conclusão que não deve atender o que o Iphan recomendou e o MPF acompanha e queira fazer na marra o projeto. Isso é possível? Claro que não é. Não pode fazer uma obra em um bem tombado pela União sem licença do Iphan”, explicou.
O presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil – departamento Pará (IAB-PA), Sávio Fernandes, participou da reunião na sede do Ministério Público. “Nós temos que continuar atentos, cobrando que a revisão do projeto apresentado seja realmente aplicada”, disse Sávio.
Também esteve presente a representante da Associação dos Amigos do Patrimônio de Belém (AAPBel), Nádia Brasil. Tanto IAB-PA quanto AAPBel participaram das mobilizações e acompanham desde o ano passado os debates contra o processo autoritário e excludente de reforma da feira.
Existem interesses muito poderosos por trás não só da reforma do Ver-o-Peso. O Ver-o-Peso é um dos elementos de um processo de gentrificação dessa área. Toda aquela área da orla e do centro histórico está sendo muito visada por interesses econômicos bem poderosos. Não é à toa esse projeto do Ver-o-Peso. Está dentro dessa lógica excludente dos trabalhadores, dos usuários, dos ribeirinhos que transitam ali”, avaliou Nádia.
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Manutenção, limpeza e segurança são questões que mais preocupam os feirantes
A cozinheira Osvaldina Ferreira trabalha no setor de refeições do Ver-o-Peso e estava entre os feirantes que foram ao MPF. No fim de semana anterior ao encontro, na feira, ela criticou o projeto de reforma da Prefeitura e disse que uma reforma mais simples resolveria o problema:
Do jeito que eles queriam fazer aquele projeto, a gente ia ter muito prejuízo. Porque aqui não existe uma feira fechada. A feira aqui tem que ser como está. Faz uma reforma no piso, coloca outra lona. Isso era o essencial. Aqui nunca teve manutenção da Prefeitura. Manutenção é a gente que faz”, reclamou.
Publicado no Blog Ver o Ver o Peso 
Reportagem: Guilherme Guerreiro Neto | Colaboração: Brenda Taketa | Imagens: Cláudia Leão.