quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

A Justiça, a inclemência do tempo e o Palacete Pequeno Príncipe


O antigo Palacete Dr. Corrêa, em todo seu esplendor (extraído do Album Belém da Saudade)
Decorrido quase um ano da Ação Civil Pública de responsabilidade por danos causados ao Patrimônio Histórico, impetrada pela 2ª Promotoria de Justiça do Meio Ambiente, Patrimônio Cultural, Habitação e Urbanismo contra Jorge Mutran Exportação e Importação Ltda., proprietária do imóvel onde funcionou o Colégio Pequeno Príncipe, o processo quase nada andou, nem sequer todos os réus foram citados. Além da lentidão funcional da Justiça, o proprietário do imóvel está se valendo de um elemento complicador, o fato de a ação apresentar como réus os sócios da empresa: Délio Mutran, Celso Mutran e Evandro Mutran, exigindo assim que sejam notificados individualmente. Até o momento apenas Evandro Mutran foi citado e mesmo assim não se manifestou. Entre um despacho e outro da juíza responsável pelo caso e entre uma visita e outra do Oficial de Justiça, que levam em média 04 meses, vemos a ação do tempo agindo favoravelmente ao lado dos réus, que após a queda completa do bem em processo de tombamento municipal e estadual, poderá vendê-lo para fazer surgir mais um arranha-céu ou um estacionamento.  
Pela leitura dos documentos anexados ao processo pelo Ministério Público, podemos imaginar o que serão capazes para dificultar o trabalho da justiça, em um deles um dos sócios alega que não pode responder pela empresa por está sendo impedido pelos outros dois irmãos a exercer seus direitos e para provar anexa um Boletim de Ocorrência contra os mesmos. 





O ingresso da Ação Civil Pública em maio de 2015, ocorreu após denúncia da AAPBEL e ASAPAM de que o proprietário, durante o reveillon de 2015 promoveu a mutilação do bem, com a retirada de telhado, forro e estruturas internas sem a devida autorização do DEPHAC/SECULT, após deixar o mesmo abandonado por anos. 


 
Na ACP, o MPE/PA requereu a concessão de Tutela Antecipada para que os denunciados:
1) privem-se de realizar qualquer intervenção no imóvel que altere sua fachada e interiores, sem a devida autorização dos órgãos competentes; 
2) Cumpram a obrigação de fazer consistente na execução das restaurações, reparos e demais obras necessárias à manutenção e conservação do referido bem imóvel, para que o mesmo seja recolocado em seu primitivo estado, tal qual se encontrava antes de iniciadas as obras de reforma, independentemente dos motivos que a provocaram, concedendo-lhe o prazo de SEIS MESES para conclusão dos serviços, com todas as despesas correndo às suas expensas, devendo apresentar projeto de restauro (completo e detalhado) ao DPHAC/SECULT, no prazo de 30 dias, contados a partir da intimação da decisão, para análise e aprovação por parte daquele órgão e, uma vez aprovado o projeto, deverá a obra se iniciar em 20 dias, sem prejuízo da intervenção judicial  na propriedade, para permitir a execução específica por interventor nomeado, se necessário, sob pena de pagamento de multa diária, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) em caso de atraso no cumprimento da decisão, como pagamento de indenização pelos danos materiais decorrentes da descaracterização do imóvel; 
 3) Em se constatando a impossibilidade de recuperação da obra arquitetônica na sua forma original, e ainda como forma de indenização por perdas e danos materiais, que postula o Ministério Público a reforma integral de um dos imóveis da lista do livro de Tombo Estadual, que deverá ser escolhido pelo Réu e, uma vez não exercida essa faculdade, caberá indicação pelo Estado do Pará, por meio do DPHAC/SECULT.

Além da Tutela Antecipada, a Promotoria pediu também:
- A condenação dos réus, em solidariedade passiva, ao pagamento de indenização pecuniária pelos ‘danos morais coletivos’ decorrentes da  demolição dos imóveis, no valor de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais), que deverá reverter ao Fundo Estadual de Cultura.
- Concessão de medida cautelar de bloqueio de bens dos réus em valor mínimo de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais).

quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Notícias sobre a obra no Palacete Passarinho

                                     

Ao constatarmos que a obra de construção de um novo prédio no imóvel havia sido retomada e a notificação de embargo havia sido retirada, apresentamos questionamento ao DPHAC/SECULT para saber como estava o processo, se a obra já estava licenciada e quais as alterações efetivadas no projeto em caso de ter sido aprovado pelo departamento. 
De pronto, recebemos a seguinte resposta da diretora do DPHAC, arquiteta Thais Toscano:


"O primeiro projeto encaminhado ao DPHAC, após o embargo da obra, foi indeferido. Tratava-se de um volume, mais alto que o Solar, contíguo a ele, que criava uma nociva interferência, relegando ao bem uma condição subalterna.
Em reunião com o proprietário e o arquiteto/autor do projeto foram feitas consideração acerca de como se deveria proceder em uma intervenção desta natureza. Solicitamos, de imediato, que o volume fosse construído na parte posterior ao lote, distanciando-se do Solar, garantindo a leitura clara e individualizada das duas arquiteturas ( a antiga e a contemporânea).
O projeto foi reapresentado, obedecendo às solicitações do Departamento. Trata-se de um volume simples, colado posteriormente ao lote, afastado do edifício de interesse, mais baixo que ele e que não interfere em sua ambiência.
A função será de restaurante.
Quanto ao Solar, será objeto de um projeto de restauro, com outros arquitetos contratados. O DPHAC deu prazo de 90 dias para o encaminhamento deste referido projeto."


Ponto para o proprietário, que reparou seu erro inicial, dando exemplo de respeito ao patrimônio da cidade e de que é possível conciliar os interesses em intervenções visando readequar o uso de um bem histórico. Ponto para o DPHAC que embargou a obra e prestou toda a orientação técnica ao mesmo. As boas intenções do proprietário do empreendimento também se denota quando aceitou recomendação do órgão de preservação em contratar pessoal especializado em restauração de bens históricos para executar o restauro do palacete. 
O ponto negativo fica com a SEURB, que licenciou a obra em bem tombado, sem exigir a análise prévia do DPHAC. 
Esperamos que além de um restaurante, a cidade ganhe também o magnífico palacete restaurado e preservado! 






segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Duas passarelas e uma cidade subjugada


Quando em 2006, o Tribunal de Justiça do Estado do Pará, passou a ter sua sede no antigo Colégio Lauro Sodré, para atender a conveniência do novo uso e de seus poderosos inquilinos, a passarela que existia ao lado do prédio foi retirada, mesmo existindo nas imediações três escolas, a E.E Cordeiro de Farias, a E.E. Albanizia de Oliveira, a E.E. Anésia Meira, além das duas escolas que foram desativadas para dá lugar ao tribunal ( Colégio Lauro Sodré e E.E. Iolanda Martins, esta de educação especial).

Lugar onde se localizava a passarela retirada em 2006, entre o Lauro Sodré e a Escola Albanizia de Oliveira 

O antigo Instituto de Artífices do Pará
Refeitório do Instituto de Artífices do Pará

Com a retirada da passarela, a magnífica edificação construída em 1872 para ser o Instituto de Artífices do Pará,  pôde voltar a ser contemplada em toda sua monumentalidade por um raio de distância bem maior, após muitos anos ter seu campo de visão encoberto, tanto do ponto de vista de quem saia do centro rumo à BR-364, por causa do viaduto construído na Avenida Dr. Freitas, como do ponto de vista de quem entrava na cidade rumo ao centro, devido à passarela.



Em 2015, após o governo do estado transferir o prédio onde funcionava a Escola de Governo do Estado para o Comando Militar do Norte, para ali ser instalada a Escola Militar de Belém, fomos surpreendidos com a notícia de que de dentro dos jardins do imóvel sairá uma passarela ligando a Escola ao quartel do 2º BIS, mesmo existindo uma passarela a alguns metros dali.



De comum entre as duas passarelas, uma cidade que é pensada e planejada a partir da lógica dos interesses imediatistas de segmentos poderosos da sociedade, uma cidade onde a preservação e valorização do seu patrimônio cultural é apenas um efeito colateral da subjugação a esses interesses e não um fim em si mesmo.
E assim vamos acumulando prejuízos aos longos desses 4 séculos, sempre sob o falacioso discurso do progresso e do desenvolvimento, como se passado e presente fossem dissociáveis e inconciliáveis.


A Aapbel e outras entidades de defesa do patrimônio foram convidadas para uma reunião no Comando Militar do Norte no último dia 22.12. Ainda que ressaltemos a gentileza da atitude e termos alimentado a expectativa de sermos ouvidos, a reunião serviu apenas para que os responsáveis pela Escola Militar expusessem o projeto da escola e os benefícios que a mesma trará para a cidade, mostrando-se irredutíveis em repensar o projeto de colocar uma passarela dentro do imóvel, interceptando visualmente o bem tombado e provocando sua parcial descaracterização.  Para os dirigentes da nova escola, o equipamento é uma questão de segurança para as crianças e jovens que se deslocarão entre um prédio e outro para realizar algumas atividades curriculares.
A sociedade está fazendo sua parte, ao lutar contra a degradação e pela preservação e valorização do seu patrimônio e exigir dos gestores públicos mais respeito à nossa memória.
A Aapbel apresentou denúncia à Promotoria de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural e a Associação Cidade Velha, Cidade Viva também fez representação junto à Promotoria de Moralidade e Patrimônio Público, questionando a razoabilidade da obra de uma passarela a poucos metros de uma já existente.
A Promotoria de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural, através da promotora Ângela Balieiro abriu inquérito administrativo e já pediu informações à SECULT, à SEURB e à SEMOB.
Leia mais aqui: http://aapbel.blogspot.com.br/2015/12/presente-de-grego-pra-belem-400-anos.html

O direito à paisagem constitui-se um dos elementos mais importantes da identificação de um indivíduo com a vida da cidade. O enfeiamento da cidade é a destruição da sua identidade e portanto, contribui para a degradação do próprio conceito de cidadania.
Hoje, aniversário da cidade, a atual gestão da Prefeitura de Belém sem nada de significativo para inaugurar e que possa ser chamado de seu, incluiu a inauguração da Escola Militar de Belém na programação oficial da comemoração dos 400 anos de Belém, a cidade merece bem mais do que isso! Merece a Escola Militar, mas não merece ser subjugada às vaidades e aos caprichos de suas elites governantes, outros 400 é possível!